História do sufrágio feminino no Brasil

Por: Rosa Cristina Hood Gautério


Ainda que, de modo geral, encontra-se uma história oficial arraigada de impressões genéricas sobre o papel das mulheres na sociedade brasileira, nas últimas décadas, porém, um grupo de pesquisadoras, no âmbito acadêmico, busca mudar essa crença. Revisitando a história e reconstituindo a trajetória, quer no resgate particular de biografias, quer no resgate de ações realizadas em conjunto por mulheres excepcionalmente incomuns, parte do grupo das pesquisadoras situa seus interesses no Brasil do século XIX, pois tanto a campanha abolicionista, quanto a republicana no final daquela centúria foram movimentos que geraram profundas mudanças na sociedade brasileira, especialmente para a questão do papel feminino. Nos primeiros anos da República, o voto para as mulheres seria a principal bandeira vinculada pela imprensa feminina, abrindo um caloroso debate em todo o país. Não se pode, porém, contar a história do sufrágio feminino sem justificar o difícil acesso à instrução e à profissionalização, arduamente enfrentados pelas mulheres no âmbito de uma sociedade criticamente hostil.

Depois da primeira legislação referente à educação feminina, em 1827, em que foram criadas escolas primárias admitindo meninas para o ensino das primeiras letras, com ênfase nas prendas domésticas, saber ler o livro de orações, decifrar uma receita para bolos, interpretar um poema ou decodificar as partituras para o piano, resumiam predicativos respeitáveis para o bom desempenho das futuras donas-de-casa. Entretanto, poucos brasileiros tinham acesso à escola e, particularmente, pouquíssimas instituições eram destinadas às meninas ou mesmo ao público misto. As filhas de famílias abastadas recebiam educação em casa, geralmente orientadas por professores estrangeiros e, posteriormente, começaram a frequentar escolas particulares, quando estas surgiram. Ensinavam-lhes habilidades consideradas adequadas para que as mocinhas de boa família pudessem contrair bons acordos matrimoniais. Não obstante, em linhas gerais, a mãe e esposa dedicada representava o setor mais tradicional dos padrões sociais, até que um novo contexto concebesse outras formas de relações marcadas pela obrigatoriedade feminina.

Aliados à noção de progresso, os movimentos da campanha abolicionista e republicana, no final do século XIX, estavam intrinsecamente fundamentados em dois princípios universais, tais como liberdade e igualdade. Na visão modernizadora do progresso, a sociedade precisava ser reordenada a partir dela mesma e a cédula principal na conversão dos indivíduos à nova ordem recaía sobre a família e, nela, a mãe, principal interlocutora com o Estado, seria responsável pela formação moral e intelectual dos filhos. Nesse contexto, a ideia de educação para as mulheres continuava se somando à ideia do dever, o que traduzia o senso comum sobre o papel das mulheres naquela centúria.
O primeiro obstáculo ao progresso foi a deficitária educação feminina que, no discurso dos legisladores, deveria ser diferente dos moldes tradicionais, pois as esposas tornar-se-iam aptas para a elevada missão de agente moralizador da sociedade. No entanto, a precariedade dos profissionais de letras obrigou o Estado a criar escolas normais para a formação de professores do ensino primário e, neste contexto, algumas moças logo vislumbraram o magistério como uma profissão. Nos idos da década de oitenta do século XIX, já havia um contingente majoritário de mulheres que assumiram o ensino nas escolas normais e muitas tinham se tornado professoras em escolas próprias. Nesse sentido, o ensino ministrado pelas mulheres serviu como agente de mudança social, ampliando não só o índice de alfabetização entre elas, como também significou um “vetor consciente de disseminação de novas ideias sobre os direitos e papéis das mulheres” (HAHNER, 2003, p. 83), nos anos seguintes.

O ambiente de avanços tecnológicos, como a invenção do telégrafo, o desenvolvimento das estradas de ferro e a iluminação pública, entre outras melhorias, estabeleceu novos parâmetros para as relações sociais. A vida política intensificou a vida pública promovida por reuniões formais e pelo consumo de lazer, atribuído à presença de homens e de mulheres nas ruas, nos cafés, teatros e bailes e, dado o privilégio da instrução das boas moças, os eventos eram motivados pelo canto, pela música tocada ao piano e pela leitura de belos poemas que encantavam a todos. Entretanto, já era possível avaliar os benefícios da instrução feminina, uma vez que entre os bordados, não só a literatura frequentava o cesto de costura das senhoras, mas também jornais e revistas estavam misturados às linhas e agulhas. Tais periódicos assumiram funções de agentes de cultura e contribuíram, inclusive, para a conquista das mulheres como primeiro público leitor no Brasil, conforme apontam os estudos de Maria Helena Werneck (1985). Em geral, os jornais editados por mulheres e para mulheres contemplavam não só literatura e recreação, mas artigos dedicados à família e elegiam as mulheres como principal alvo dos seus discursos. Mesmo que mantendo certa normatização sobre a educação feminina ao assumirem um compromisso com a “formação moral” das senhoras, os jornais tinham um claro intuito: valorizá-las na intimidade do lar e afirmar a igualdade entre os cônjuges1.

Naqueles tempos de campanha republicana, algumas mulheres escaparam do modo generalizado de dominação em que estavam mergulhadas e, ao invés de reproduzir papéis tradicionalmente exigidos pelo sistema de obrigações, trataram de lutar contra os obstáculos produzidos pela política do final do Império. Desse modo, buscando uma conexão entre educação e direitos, as feministas2, que tiveram o pioneirismo nome de Nísia Floresta3, aproveitaram a agitação política para transformar em mote o direito à educação de base e universitária. Na tentativa de forçar uma atuação mais ampla na sociedade, as mulheres defenderam a oportunidade de estudos igual aos homens, uma vez que não havia licença para frequentarem faculdades no Brasil, qualquer mulher que desejasse cursar uma escola superior teria que sair do país, como foi o caso de algumas brasileiras que obtiveram seus diplomas4. Embora o espírito progressista considerasse as mulheres inferiores de inteligência, “nenhuma mudança social ocorre sem que a sociedade tenha já caminhado no sentido de possibilitá-la” (ALVES, 1997, p. 97). Nesse sentido, na luta para vencer os obstáculos culturais, as mulheres pautaram-se nos argumentos utilizados pela própria retórica do patriotismo, segundo o qual defendiam o progresso do país com a participação das boas mães. Depois de enorme celeuma por conta das teorias filosóficas que insistiam na incapacidade feminina para as atividades científicas, baseadas na inferioridade orgânica do cérebro feminino, finalmente a lei da reforma educacional, em 1879, abriu a escola superior para o público feminino no Brasil.

Nesse contexto, graduadas e politizadas para o desconforto de homens e algumas senhoras da sociedade, apesar da perseverança estratégica do discurso masculino, as profissionais começaram a ingressar em carreiras de prestígio. Por esse lado, médicas, advogadas e professoras queriam ampliar a igualdade jurídica entre homens e mulheres que, para elas, estaria vinculado ao direito do voto, como direito humano numa igualdade em todas as esferas. Com esse propósito, ainda no final do período monárquico, a dentista Isabel de Mattos Dillon, apelando para a Lei Saraiva criada em 1881 que estabelecia direito de voto aos portadores de diploma superior, tentou seu alistamento e chegou a se apresentar como candidata à Constituinte, mas o ministro Cesário Alvim, ao saber do pedido, ditou outra forma de eleição para a Assembléia a fim de evitar essa possibilidade e impedir novas reincidências.

Um ano depois da queda da monarquia e da implantação do regime republicano provisório, formava-se um congresso que debateria questões políticas para a elaboração da primeira Constituição republicana do país. De início, o sufrágio permanecia proibido às mulheres, inclusive porque o direito de voto no Brasil também era limitado aos cidadãos, pautado pelo voto censitário5, sendo esse abolido pela nova Constituinte. Mas, acirravam-se sucessivas discussões sobre questões políticas no geral e o sufrágio feminino, em particular. O grande número de antissufragistas ainda discutia nos salões do Congresso a questão da incapacidade física e intelectual das mulheres, dada pela sua “natureza particular”6. Tal posição articulada pelos positivistas considerava a mulher parte moral da sociedade e, opondo-se, por isso, ao voto em favor da manutenção moral da família. Os defensores do sufrágio eram minoria, mas havia grande expectativa com a elaboração de uma emenda em favor das mulheres, tal como: “Nos termos do artigo 72. 2º: fica conferido o direito eleitoral às mulheres diplomadas com títulos científicos e de professoras, às que estiverem de posse de seus bens, nos termos da lei eleitoral” (Anais do Congresso Constituinte, vol. II, p. 439, de 1º.1.1891). Tentando coagir uma decisão a favor, mais uma vez, algumas graduadas colocaram seus nomes nas listas de eleitores. Entretanto, no parecer dos 21 membros da Constituinte, apenas 7 foram favoráveis à concessão e a emenda caiu. Mais uma vez as mulheres foram alijadas de sua cidadania.
Ridicularizadas e menosprezadas por grande parte da sociedade, as intelectuais encontraram oposição na esfera pública. Nos jornais apareciam críticas em forma de crônicas e notas que provocavam o riso, embasadas em argumentos fúteis e frágeis, como acontecia, por exemplo, nas edições da Revista Ilustrada, jornal satírico brasileiro que zombava dos movimentos relacionados aos direitos à igualdade civil. Entretanto, para defender opiniões opostas, os jornais femininos tinham uma postura reformista, quando, por exemplo, a jornalista e escritora Andradina de Oliveira publicava no seu jornal Escrínio, as conquistas políticas femininas em países estrangeiros. E a título de reforço, contrariando a ideia generalizada da cultura intelectual do país, a jornalista e dramaturga Josefina Álvares de Azevedo, resumiria, num único ato da peça O voto feminino7, a ordem de uma sociedade conservadora que subestimava a capacidade intelectual das mulheres. Texto notadamente utilizado para sensibilizar os congressistas que preparavam a nova Constituição, publicada em 1891, mas, ainda, sem a aprovação do sufrágio feminino.

Com a República instaurada, as feministas redobraram seus esforços e um moderado movimento organizado por mulheres começou a surgir no Brasil, como foi o caso do Partido Feminino Republicano fundado pela baiana, professora e jornalista, Leolinda de Figueiredo, em 1910. Como a questão do sufrágio feminino não tinha mais sido discutida desde 1891, ela teria a missão de levar a discussão para dentro do Congresso. Entre outras questões, o partido advogava também pelo direito das mulheres concorrerem a cargos do serviço público, restritos aos homens. Ainda no ano de 1910, Mirtes de Campos, a primeira advogada a ser aceita na Ordem dos Advogados do Brasil, consciente da excepcionalidade do momento, pede alistamento eleitoral, argumentando que o texto da Constituição (de 1891) não esclarecia o gênero do eleitor e, segundo a advogada, a má interpretação pecava, inclusive, contra o artigo que citava: “todos cidadãos são iguais perante a lei”; entretanto, seu requerimento foi indeferido.

Em 1917, Maria José de Castro Rebelo Mendes, filha de ilustre político, teve autorização concedida para participar do concurso para um cargo do Ministério das Relações Exteriores e, conquistando o primeiro lugar, foi exemplo para outras mulheres que seguiram seu caminho. Mesmo diante de algumas conquistas, mas reconhecendo que o caminho ainda seria árduo, as feministas organizavam-se com o objetivo de suscitar o interesse e o apoio, não só da pequena comunidade política, mas também da sociedade em geral. Para isso, em novembro daquele ano, a população do Rio de Janeiro foi surpreendida com a passeata, pelas ruas, de um pequeno grupo de mulheres que, com o apoio da imprensa feminina, conseguiu alcançar o objetivo de uma campanha, pelo sufrágio, efetiva e bem divulgada.

Dentre os debates e pareceres jurídicos daqueles que interpretavam a Constituição, os argumentos contra o sufrágio ainda estavam calcados em questões morais, mas sem justificativa jurídica que se sustentasse, usando os mesmos argumentos utilizados pelos congressistas no final do século XIX. E quando as argumentações pautavam-se em aspectos jurídicos, alegavam que a mulher casada ou solteira era dependente do marido ou do pai e, portanto, não tinha liberdade para o exercício do voto consciente, restringindo a questão do sufrágio apenas numa razão moral valorativa. Tais argumentos foram mantidos, incansavelmente, em todos os debates do Congresso, obrigando as sufragistas a buscar apoio junto a juristas de renome, como o deputado Juvenal Lamartine, do Rio Grande do Norte, um dos maiores aliados do sufrágio feminino dentro do Congresso.

Chega ao Brasil Bertha Maria Julia Lutz8, que se tornaria a grande mentora da campanha sufragista brasileira. Depois de alguns anos de estudos na Europa e acompanhando a campanha sufragista na Inglaterra, Bertha, reconhecida pela repercussão de sua nomeação ao cargo de secretária do Museu Nacional depois de prestar concurso, anuncia-se publicamente como feminista e funda, em 1919, a Liga pela Emancipação Intelectual da Mulher, substituída, em 1922, pela Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, a FBPF. Acirrando a campanha pelo sufrágio feminino brasileiro junto aos congressistas, as militantes da Federação organizam o Primeiro Congresso da Federação Brasileira pelo Progresso Feminino, em 1922. Pela experiência e os contatos que Bertha tinha fora do Brasil, o movimento brasileiro começou a chamar a atenção das elites dentro e fora do país. Mobilizando um número cada vez maior de mulheres, a FBPF manteve um programa de rádio para fazer propagandas e chamamentos às mulheres para os fóruns de discussões e para a participação ativa delas nas sessões do Congresso. A cobertura das ações da FBPF pela imprensa nacional e internacional promoveu ligações do movimento brasileiro com os movimentos internacionais, o que resultou na participação de Bertha no IX Congresso da Aliança Sufragista Feminina Internacional, em 1923, em Roma, e como delegada no Congresso Inter-Americano, de 1925, em Washington (HAHNER, 2003). Nos anos de 20 e 30, a FBPF se ramificou formando outros grupos de apoio e chegando a congregar 12 associações por todo o Brasil, como a Associação de Funcionárias, a Associação de Mulheres Universitárias e a Associação de Professoras, entre outras.

Muitos foram os projetos em favor do voto feminino enviados ao Congresso Nacional, mas todos foram engavetados e não passaram nem da primeira leitura , e alguns nem sequer foram discutidos. Um exemplo foi o projeto do senador Justo Chermont que defendia o voto para mulheres com 21 anos de idade. O projeto foi enviado à Comissão de Constituição e Diplomacia em 19.12.1919, e teve uma opinião favorável, mas somente em 14.5.1921 o Congresso aceitou sua leitura, entretanto levou 6 anos para apresentar uma emenda. Ou, ainda, o projeto de Basílio de Magalhães que, em 1924, reservava o voto para as mulheres com permissão dos maridos. E, em 1925, uma coerente posição política eleva os ânimos das sufragistas, tratava-se do projeto do senador Moniz Sodré que reconhecia às mulheres todos os direitos políticos como “cidadãos brasileiros”, o que chamou a atenção do movimento feminista, quanto à inclusão das mulheres no termo “cidadãos”.

No ano de 1927, Juvenal Lamartine, o então candidato à governança do Rio Grande do Norte, garantiu as mudanças no Código Eleitoral do seu estado tornando as mulheres as primeiras brasileiras a exercerem o direito de voto no Brasil. Nas eleições daquele estado, elas elegeram no município de Lages, a candidata Alzira Teixeira Soriano, como primeira prefeita feminina. Como resultado dessa primeira vitória, as sufragistas intensificaram a campanha pelo voto e estavam presentes no Senado que se reuniu para debater, não só a questão do sufrágio feminino, como também determinar a invalidação dos votos das mulheres na eleição do senador potiguar José Augusto, pois no entendimento dos congressistas os votos das mulheres eram permitidos em nível estadual e não federal, o que provocou um verdadeiro alvoroço no movimento. Revoltada com a anulação dos votos, a FBPF lançava a “Declaração dos Direitos da Mulher” em forma de manifesto que congregava outros vários protestos lançados pelo feminismo internacional. Massificando a presença feminina nas sessões da Câmara, as mulheres intensificaram sua campanha na forma de distribuição de panfletos com discursos de parlamentares, cartazes com citações de juristas famosos, folhetos com indicações dos países que permitiam o voto feminino e, ainda, apresentando um abaixo-assinado com duas mil mulheres politicamente ativas, pedindo a aprovação da emenda do voto. Dessa forma, a FBPF garantiu a amplitude necessária junto aos constituintes. Paralelamente, Bertha Lutz e Maria Amália Bastos, primeira secretária da FBPF, sobrevoaram a Capital federal (Rio de Janeiro), jogando panfletos que convocavam a união da população em defesa dos direitos das mulheres; em suma, as sufragistas mantinham extrema pressão sobre a classe política.

Num momento de crise das oligarquias do país, onde as correntes partidárias começavam articulações políticas que culminariam com a ocupação da presidência do Brasil por Getúlio Vargas, a gaúcha Nathércia da Silveira, funda a Aliança Nacional de Mulheres, a ANM, com base em Minas Gerais. Segundo a fundadora, o movimento buscava apoio das mulheres operárias e, ao mesmo tempo, tinha como objetivo proteger as trabalhadoras “esquecidas pelo governo”. Reunindo mulheres de todas as classes sociais, a Aliança promoveu naquele estado um congresso feminista em 1931, dando força ao movimento do sufrágio no Brasil, mas a Aliança teve suas ações interrompidas em 1937.

Quando, em 1930, Getúlio Vargas assume o poder como novo presidente, a estrutura política do país é alterada e o governo promete, publicamente, reexaminar as práticas políticas, incluindo uma reforma no Código Eleitoral. O pragmático presidente provou desejar ouvir as minorias negligenciadas, tais como a classe operária e a população pobre, mas o projeto das feministas parecia ser indiferente. Novamente a FBPF serviria para dar ampla ressonância ao movimento, quando organiza o II Congresso Internacional no Rio de Janeiro, em fevereiro de 1931. Com representantes do movimento de 15 estados do Brasil e de 8 países estrangeiros (HAHNER, 2003), o movimento alcançou o grau de reconhecimento de luta que desejavam, pois, enfim, o direito ao voto foi assegurado às mulheres em nível nacional com o novo Código Eleitoral em 24.2.1932, pelo Decreto n. 21.076, confirmado pela Constituição de 1934. O Brasil tornou-se o quarto país do ocidente a garantir o sufrágio feminino, atrás de Canadá, Estados Unidos e Equador. Carlota Pereira de Queiróz, educadora e diplomada em medicina, foi a primeira mulher a conquistar uma vaga no Congresso brasileiro, confirmada nas eleições de 1933, enquanto Bertha Lutz conquista uma suplência. Foram também eleitas deputadas estaduais em Minas Gerais, São Paulo, Sergipe, Amazonas, Bahia e Alagoas (ALVES, 1980).

Atualmente, ainda se percebe “que há um déficit de representação da mulher na democracia brasileira” (REIS, 2012, p. 445), vez que há um descompasso da participação delas em todas as esferas sociais e políticas. Entretanto, nas eleições de 2012, a participação das mulheres na política representou o reflexo de toda uma luta historicamente instituída pela condição igualitária à cidadania. Segundo a Secretaria de Políticas para as mulheres, SPM-PR, o número de vereadoras aumentou 17,4% e o de prefeitas 32,9%, em todos os estado do Brasil, graças a ações afirmativas como a vigência da Lei n. 12.034, de 29.9.2009, que estabelece que “cada partido ou coligação, preencherá o mínimo de 30% e o máximo de 70% para candidaturas de cada sexo”, ampliando os espaços políticos para as mulheres. Segundo o professor José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia e professor titular da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, o número percentual de mulheres eleitas na região sul do Brasil, em 2012, foi de 14,1% no Rio Grande do Sul, enquanto Santa Catarina elegeu 13,5% e Paraná 11,4%. Tais estatísticas revelam ainda um caminho a ser trilhado pelas mulheres brasileiras em termos de participação efetiva junto ao poder público, responsável pelas discussões que tratam dos direitos e da situação social dos cidadãos e das mulheres em particular. A participação das mulheres na esfera política trará gradativamente uma ajuda substancial em prol da cidadania e contra qualquer política de exclusão.

REFERÊNCIAS

ALVES, Branca Moreira. Ideologia e feminismo: a luta pelo voto no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1980.
ALVES, José Eustáquio Diniz. O avanço das mulheres nas eleições de 2012 e o déficit democrático de gênero. Disponível em www.sst.sc.gov.br/conselhos/cedim/o-avanco-das-mulheres-eleicoes.pdf. Acesso em 6.6.2013.
DUARTE, C. L. Feminismo e literatura no Brasil. Estudos Avançados. V. 17, n. 49, São Paulo, set./dec., 2003.
HAHNER, June E. Emancipação do sexo feminino: a luta pelos direitos da mulher no Brasil, 1850-1940. Tradução de Eliane Lisboa. Florianópolis: Ed. Mulheres; Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2003.
REIS, Márlon. Direito Eleitoral Brasileiro. Brasília: Alumnus, 2012.
SECRETARIA DE POLÍTICAS PARA AS MULHERES. Disponível em www.mulheres.gov.br/noticias/ultimas_noticias/2012/11/28-11-acoes-afirmativas-ampliam-espacos-politicos-para-as-mulheres-avaliam-spm-e-bancada-feminina. Acesso em 10.5.2013.
SILVA, Regina Célia Andrade da. Muito além dos estereótipos: Patrícia Bins, uma arqueóloga da alma. In RAMALHO, Christina (org.). Literatura e feminismo: propostas teóricas e reflexões críticas. Rio de Janeiro: Elo, 1999.
SOUTO-MAIOR, Valéria Andrada de. O florete e a máscara: Josefina Álvares de Azevedo, dramaturga do século XIX. Florianópolis: Ed. Mulheres, 2001.
WERNECK, M. H. V. Mestra entre agulhas e amores: a leitora do século XIX na literatura de Machado e Alencar. Rio de Janeiro: PUC, 1985.

NOTAS

1 Este era um dos propósitos d’O jornal das senhoras, publicado no Rio de Janeiro, ainda em 1852, tendo como redatora inicial a argentina Joana Paula Manso de Noronha, considerado o primeiro jornal feminino no Brasil, e o jornal A Família, fundado em São Paulo, em 1888, por Josefina Álvares de Azevedo, que defendia a educação feminina como suporte de emancipação. Ainda, o jornal Escrínio, publicado no Rio Grande do Sul, em 1898, tendo como redatora Andradina América de Andrada e Oliveira, publicava as conquistas femininas na educação. As reivindicações das redatoras causavam muita polêmica, cada uma ao seu tempo, por apresentar uma visão bastante revolucionária para os padrões morais da família burguesa na época.
2 FEMINISMO: nesse ponto, localiza-se a luta das mulheres desde suas primeiras manifestações, quando ainda não se tinha nenhum grupo organizado no Brasil, o que viria acontecer somente no século XX.
3 Nísia Floresta era pseudônimo de Dionísia Gonçalves Pinto. Nascida no interior do Rio Grande do Norte, em 1810, foi pioneira do feminismo no Brasil rompendo os limites do espaço privado, quando publica o livro Direito das mulheres e injustiça dos homens, em Recife no ano de 1832, em que trata do direito das mulheres à instrução, segundo nos conta a pesquisadora Constância Lima Duarte a quem devemos os estudos sobre a vida e a obra da feminista. Nísia viveu muito tempo na Europa e lá manteve contato com muitos intelectuais, entre eles o filósofo Augusto Comte. Trouxe para o Brasil ideias avançadas para o seu sexo, promovendo conferências em 1842 sobre a abolição e a República, fato extraordinário para o mundo masculino.
4 Apesar dos obstáculos, algumas mulheres se espelharam no exemplo de Maria Augusta Generosa Estrela, carioca que, com o financiamento do pai, graduou-se e pós-graduou-se em medicina nos Estados Unidos, voltando para o Brasil e exercendo sua profissão por muitos anos, desenvolvendo uma especialização no atendimento de mulheres e crianças. A primeira mulher graduada em medicina no Brasil foi a gaúcha Rita Lobato Velho Lopes, na Escola de Medicina de Salvador, em 1887. Em 1889, a também gaúcha Antonieta Dias Morpurgo gradua-se na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. E Mirtes de Campos, primeira mulher a entrar na escola de direito do Rio de Janeiro, teve direito de defender seu primeiro cliente só depois de uma permissão especial do juiz Francisco José Viveiros de Castro, e só em 1906 conseguiu sua admissão no Instituto da Ordem dos Advogados do Brasil (HAHNER, 2003).
5 O voto censitário significava restrição nas urnas, uma vez que só poderiam ser eleitores e candidatos a cargos os homens maiores de 21 anos de idade, e ter uma renda anual x, mas analfabetos, pobres, mulheres e membros de ordens religiosas permaneciam sem o direito ao voto.
6 O Positivismo é uma corrente de ideias do século XIX que lutava para se consolidar como pensamento político central. Em relação às mulheres, os positivistas argumentavam, dentro de uma concepção simbólica da diferença entre homens e mulheres, que elas, as mães, tinham uma função nobre: formar bons cidadãos. E, com isso, inegavelmente estabeleceram o lugar das mulheres na esfera privada, sedimentando uma herança patriarcal consolidada em padrões de subordinação.
7 Engajada no movimento, a jornalista e escritora, e abolicionista, numa primeira e única experiência como autora dramática, Josefina de Azevedo leva ao público a peça O voto feminino representada no Teatro Recreio Dramático no Rio de Janeiro, em 1890. Com intenção primordialmente política, a peça apresentava um caráter lúdico e didático traçando uma caricatura de homens conservadores e preconceituosos que, despreparados intelectualmente, vivem situações análogas da reconhecida rivalidade entre os sexos. A peça foi publicada no jornal A Família, como estratégia e instrumento de propaganda para a campanha do sufrágio. Sua intenção de sensibilizar os congressistas foi frustrada, vez que o voto feminino foi aprovado muito posteriormente (SOUTO-MAIOR, 2001).
8 Bertha Lutz, filha do pai suíço-brasileiro Adolfo Lutz, um pioneiro da medicina no Brasil e da mãe Anmy Fower, ex-enfermeira voluntária no Havaí, passa grande parte dos seus estudos na Europa, onde se gradua em Ciência pela Universidade de Sorbonne, Paris, e no Brasil, Bertha diploma-se em direito pela faculdade do Rio de Janeiro, tornando-se uma das maiores responsáveis pela campanha sufragista da mulher brasileira.
9 Os projetos teriam que passar por três leituras para a aprovação.

Graduada em Letras/Português pela Universidade Federal do Rio Grande – FURG (RS). Mestre em Letras, na linha de pesquisa “Literatura, história e memória literária”, pela mesma universidade. Doutoranda do curso de pós-graduação em Literatura, na linha de pesquisa “Crítica feminista e estudo de gênero”, da Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC. Participante do Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE), apoiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES (Processo nº 6199/13-5).


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